Há algumas coisas na vida que só
o tempo pode nos oferecer; uma delas e que, na minha opinião, é a mais
importante, é a experiência que adquirimos com o decorrer dos anos. A
experiência torna-se parte fundamental pelo simples fato de nos presentear com
sentimentos: alguns que já tínhamos experimentado no passado e revivemos e
outros inéditos para os nossos sentidos.
Todas as sensações e sentimentos
são válidos, mas quero dar ênfase em um deles que todo ser humano luta para não
ter e, quando o tem, luta para não perde-lo. Estranho, não?
O sentimento a que me refiro é a
ilusão −
sim, ‘ilusão’. Ela nada mais é que o engano da nossa mente e não pense que esse
estado é apenas inconsciente. Às vezes, temos a certeza dos fatos e do que vai
acontecer em nossas relações, mas, de propósito, nos apegamos à ilusão que
criamos como uma forma de esperança vazia, para alimentar a nossa vaidade ou
para mascarar o sofrimento que a realidade pode nos trazer.
Quando percebemos a ilusão em
nossas relações humanas e, mesmo assim, decidimos continuar, é a mesma coisa
que querer adiar o inadiável, remediar o que não tem remédio e administrar o
que não cabe à administração. A ilusão
se transforma em um ópio, ajuda na hora do desespero, mas sozinha não leva a
lugar algum.
Para mostrar como a ilusão é
confortável, pense comigo, vou personificá-la.
Ela é uma mulher linda, com o
sorriso mais largo e bonito que já viu, traz sensualidade nos olhos, lábios
rosados e macios te mandando um beijo, cabelos longos que ela sempre ajeita
atrás da orelha para não atrapalhar sua visão, mas você sabe que ela o faz
também para te ajudar a admirar seu rosto melhor. Do mesmo jeito que sabe tudo isso, você
também sabe que ela está distante, cada vez mais, sabe que dificilmente será a
mesma coisa que já foi em tempos áureos, mas você não quer largar isso, por
falta de coragem, por medo do vazio ou porque tem uma esperança nata de que a
situação possa melhorar com o tempo apesar das dificuldades. Isso é a ilusão.
A ilusão é o único sentimento que
permite que você escute em seus sonhos uma das músicas mais sublimes feitas
para a paixão e que dá asas à imaginação. Ne
me quitte pas (eternizada em “Presença de Anita” aqui no Brasil). Você a
escuta em terceira pessoa, a tiracolo, aquele francês perfeito, ela fala
olhando em seus olhos. Je ferai un
domaine, où l'amour sera roi, où l'amour sera loi, où tu seras roi, ne me
quitte pas, ne me quitte pas, ne me quitte pas. Como não querer isso? Acho
humanamente impossível.
Não julgo quem bebe da fonte da
ilusão, está claro que ela é mais bonita, mais confortável e acolhedora, mas eu
digo: uma hora ela vai ter que acabar, porque, no fundo, todos sabemos que
ilusão implica imaturidade, medo de encarar a vida e a nossa vaidade dizendo que
não temos que perder o que ainda
queremos e que, de certa forma, lutamos por aquilo do nosso jeito.
Para finalizar, quero dizer que,
se você quer a ilusão, boa sorte, realmente ela é mais afável. Mas é um caminho
escuro com uma volta pior que a realidade. Já se você escolher a realidade, que
é a escolha mais sensata a fazer, será mais cruel de início, fere na carne logo
no começo, só que quando o machucado vem mais cedo, temos mais tempo para nos
recuperar. Independentemente do caminho
que escolher, quero fazer um registro: sendo ilusão ou realidade, ninguém esta
imune a ouvir, em uma madrugada enluarada qualquer, seja
nos sonhos ou em um bar pelo mundo tomando um vinho de Bordeaux, seu desejo
pedindo e cantando ‘Ne me quitte
pas’.
Imagem por Abyss - Alpha Coders
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